"O irônico é uma vampira que sugou o sangue de seu amante e o abanou com frescor, o embalou até dormir e o atormenta com sonhos turbulentos" (Soren Kierkegaard. In: The Concept of Irony).

quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Feliz Ano Novo!

É do nascedouro da vida a grandeza.

É da sua natureza a fartura
a ploriferação
os cromossomiais encontros,
os brotos os processos caules,
os processos sementes
os processos troncos,
os processos flores,
são suas mais finas dores
As conseqüências cachos,
as conseqüências leite,
as conseqüências folhas
as conseqüências frutos,
são suas cores mais belas


É da substância do átomo
ser partível produtivo ativo e gerador
Tudo é no seu âmago e início,
patrício da riqueza, solstício da realeza


É da vocação da vida a beleza
e a nós cabe não diminuí-la, não roê-la
com nossos minúsculos gestos ratos
nossos fatos apinhados de pequenezas,
cabe a nós enchê-la,
cheio que é o seu princípio


Todo vazio é grávido desse benevolente risco
todo presente é guarnecido
do estado potencial de futuro


Peço ao ano-novo
aos deuses do calendário
aos orixás das transformações:
nos livrem do infértil da ninharia
nos protejam da vaidade burra
da vaidade "minha" desumana sozinha
Nos livrem da ânsia voraz
daquilo que ao nos aumentar
nos amesquinha.


A vida não tem ensaio
mas tem novas chances


Viva a burilação eterna, a possibilidade:
o esmeril dos dissabores!
Abaixo o estéril arrependimento
a duração inútil dos rancores

Um brinde ao que está sempre nas nossas mãos:
a vida inédita pela frente
e a virgindade dos dias que virão!"


(Poema "Libação", de Elisa Lucinda)


P.S.: Um amigo me enviou este poema de Lucinda, não resistir e compartilho com vcs!

Feliz Ano Novo!

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Poeminha do contra


Tirei esta foto da foto, simulacro do simulacro, quando fui à Casa de Cultura Mário Quintana, em Porto Alegre. Me encantei com o sorriso do poeta e logo, abaixo, este poeminha, uma das minhas orações diárias, que me acompanha desde Feira.
E olha que eu venho passarinhando a muito tempo, mas de vez em quando baixo as armas, e acredito que as pessoas são boas ou não querem atravancar a não ser o seu próprio caminho. Mas, de quando em vez, me deparo com alguns atravancadores de caminhos alheios, me chateio, caio na real (isso aqui não é novela, menina!) e, logo depois, penso e rezo a oração que Quintana fez para mim.  
Sim, ele fez para mim, para vc e para todos nós. Acho que para entendermos que tantos os atravancadores quanto os problemas que eles nos trazem irão sempre passar, enquanto eu continuarei e, vc se quiser, a passarinhar!!
Viva Quintana!!!

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Há saudades!

Há saudades!

De quando era criança.
Das galinhas de minha bisa me “pinicando” os pés e a canela.
De minha vó me acordando às 5hs da manhã para tomar banho e ir para a escola.
De minha mãe com seu abraço aconchegante e seu choro de cachoeira.
De um pai.
De meus irmãos e irmãs, todos juntos, numa mesa grande colonial esperando o cuscuz de bisa.
De minhas sobrinhas me sufocando de saudades e carinho.
De meu sobrinho, de ser tua tia.

Há saudades.

De Andar...aí.
Do Bar d’Amina.
De Igatu.
Do Pati.
Dos banhos de rio.
Das noites que ficávamos até a madrugada na ponte tomando vinho e desafinando.

Há saudades.

Dos meus cabelos encaracolados, vermelhos.
De jogar handebol.
Da comida de Tia Verinha e de sua casa aberta a todos.
Das amizades que não resistiram.
Das amizades que resistiram.

Há saudades.

De ler sem fichar e resenhar.
De dançar até o amanhecer.
De beber até cair.
De não me preocupar tanto.
De ser mais leve.
De confiar sem suspeição.

Há tantas saudades!


quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Sobre a solidão


Eu, tu, a solidão e a morte



EU - Acompanhados ou não. A solidão nos habita. Está SEMPRE conosco.

TU - A morte também.

EU - Ufa! Que bom: pensei que erámos só eu a solidão!

TU - Já não morremos sozinhos. Vejo-as ao meu lado.

EU - Elas te espreitam no silêncio?

TU - Não. Dão gargalhadas! Ou: não dão gargalhadas.

EU - Vês Sísifo subindo o monte. Olhe ao seu lado.

TU - Consegue vê-las?

EU - Olhe direito. Ali. Estão lá.

TU - Que bom. Ele não está tão só.

EU - Vês Nair fazendo um aborto, a perfuração, o sangue,

TU - Glorinha que se vai e se esvai...

EU - Elas estão lá,

TU - dando-lhe o beijo que tanto queria na hora do retorno.


                                                                 

(Des)acompanhada


Cena 1:

Um show de MPB. É daquela banda que adoro. Os ingressos já estão sendo vendidos... Esse final de semana não, querida. Combinamos de ir à casa dos meus tios. Eu te avisei. Tudo bem, tinha me esquecido. Bom, daqui a quinze dias, haverá um musical naquele teatro do centro da cidade. O grupo é ótimo. Pensei em te convidar. Poxa, amor, você sabe que não curto teatro. A gente podia ir a um barzinho, tomar umas cervejas. Conversamos um pouco e depois seguimos para a minha casa. Que tal?

Cena 2:

Amiga, quanto tempo! Como tem andado? Morro de saudades da época da faculdade. Nos matávamos de estudar, mas também nos divertíamos um bocado. Tem notícias da galera? Nunca mais vi ninguém. Foi muito bom te encontrar por aqui. Olha, no sábado darei uma festa em minha casa. Vai rolar boa música. Chorinho. Você gosta? Me dá o teu celular. Vou te ligar e te passar o meu endereço. Gosto, sim. Vou aparecer. Obrigada pelo convite. Vá mesmo. E pode chamar quem você quiser, viu? Certo, mas acho que não levarei ninguém. Ah, desculpe, não tem quem te acompanhe? Está solteira ainda, moça? Você, hein, sempre exigente. Não é isso. Eu tenho companhia, mas ando só.

Lidiane Nunes.



Solitudinária


40 apartamentos ─ 40 galáxias.

Quase 200 pessoas ─ estrelas esgotadas.

Mais porteiros, visitantes e empregadas estressadas.

E a faxineira que vem toda quarta cantando “bororó, bororó”.

Todos moram comigo.

E eu moro só.

BARBOSA, Carlos. A segunda sombra. Rio de Janeiro: Multifoco, 2010.


Foto 1: Mr. Badger

Foto 2 : Imapix

sábado, 23 de outubro de 2010

Outra viagem ao Rio Grande do Sul




Assistir ao documentário experimental, Ilha da Flores (1989), dirigido por Jorge Furtado, e encontro mais um Brasil atual, ácido e cruel. Encontro os homens numa escala inferior à dos porcos. O homem sem escolha, sem liberdade, sem poder decidir como viver. A sinopse do curta se resume na história de um tomate plantado, colhido, transportado e vendido num supermercado, mas apodrece e acaba no lixo. Acaba? Não. O documentário segue-o até seu verdadeiro final, entre animais, lixo, mulheres e crianças.
No final, ouvimos e vemos que "O que coloca os seres humanos da Ilha das Flores numa posição inferior aos porcos na prioridade de escolha de materiais orgânicos é o fato de não terem dinheiro nem dono. Os humanos se diferenciam dos outros animais pelo telencéfalo altamente desenvolvido, pelo polegar opositor e por serem livres. Livre é o estado daquele que tem liberdade. Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda".

É inacreditável, mas assim é o Brasil: cheio de pequenos brasis que ainda nos assustam pela discrepância e desigualdade entre os homens (e os bichos)!!

(Mais informações: http://www.casacinepoa.com.br/os-filmes/produ%C3%A7%C3%A3o/curtas/ilha-das-flores).

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

III Encontro de Pós-Graduação em Letras – ENPOLE


O ENPOLE é um evento de projeção nacional que visa ao debate sobre as diferentes abordagens dos estudos liguistícos e literários na pós-graduação em letras. Esta terceira edição prioriza o enfoque nos DESLOCAMENTOS CULTURAIS. Com o intuito de levar essa discussão para uma visão politizada da pesquisa em letras, o prof. Dr. Prof. Dr. Benjamin Abdala Júnior (USP/CAPES) abrirá este evento com uma conferência: "Comunitarismo supranacional e os estudos literários".

Com o propósito de aprofundarmos as discussões em torno das diferentes metodologias de pesquisa nos programas de pós-letras/linguística, o III ENPOLE está recebendo propostas de professores doutores para compor as mesas-temáticas que priorizarão a divulgação de pesquisas relacionadas ao tema desta edição.

Por trata-se de um evento acadêmico, este evento está voltado para pesquisadores de Letras e áreas afins: professores universitários, doutorandos, mestrandos, graduados. Além disso, com o intuito de propor uma reflexão entre as pesquisas da pósgraduação e da graduação abrimos espaço para a apresentação de comunicação apenas para os pesquisadores vinculados oficialmente aos programas de pibic, pibix, pibid, entre outros, de pesquisa em instituições de nível superior.

Mais informações: http://www.pos.ufs.br/letras/enpole2010/index.php

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Um passeio pelo Rio Grande do Sul

"Livre é o estado daquele que tem liberdade. Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda". (Ilha das flores - 1989)

Participei do IV Colóquio Internacional Sul de Literatura Comparada (6-8 outubro de 2010) apresentando um trabalho sobre a ironia nas obras Os sete gatinhos, de Nelson Rodrigues, e em O pecado de João Agonia, de Bernardo Santareno. Mas, aproveitei para ficar com meu marido, que me acompanhou na viagem, até o dia 10 e conhecer o que pudesse no Rio Grande do Sul. Primeiro, fomos até o Mercado Público para comer e beber uma cervejinha (que ninguém é de ferro!!). Adorei aquele lugar: muita gente junta, comida boa, bebida gelada, artesanato, guloseimas...


Daí, seguimos para a Casa de Cultura Mário Quintana e lhes digo: valeu apenas demais!! A sensação que tive foi de estar mais íntima desse poeta que tanto amo (bem sabem aqueles mais próximos de mim a quanto tempo o Poeminha do Contra me acompanha!!). Para quem deseja seguir para o RS adianto que nesta Casa é possível ver muitas fotos de Quintana, poesias, uma réplica de seu quarto (a sensação é que ele acabou de acordar e seguiu para o banho deixando para trás aquela velha e íntima bagunça matinal), ter acesso à documentos pessoais do poeta, ao Quintana's bar, à oficinas de artes cênicas, informações diversas sobre artistas e espetáculos produzidos na capital gaúcha e, ainda, se deliciar com a leveza do Jardim Lutzenberger e com O Espaço O tempo e o Vento, em homenagem a Érico Veríssimo. Por isso, quando puderem, não percam tempo e sigam para uma das casas de Mário Quintana em Porto Alegre!


                                          Réplica do quarto do poeta Mário quintana 

Neste mesmo dia, tbm fomos à Usina do Gasômetro, perto do Rio Gauíba (agora rebaixado à lago pela burocracia dos homens). Da Usina se tem uma vista privilegiada, feiras de artesanatos, cursos, oficinas e um ótimo atendimento!!

                                                  
Mas, não paramos por aí... Visitamos a Pça da Matriz (LINDA!!!), localizada no coração de Porto Alegre, onde se encontra o Monumento de bronze em homenagem ao estadista gaúcho Júlio de Castilhos, criado pelo escultor Décio Villares, além da Catedral Metropolitana de Porto Alegre, o Theatro São Pedro e o Palácio Farropilha.


Depois, seguimos para o Museu da Comunicação Hipólito José da Costa, uma instituição cultural voltada para a conservação, a pesquisa e a divulgação da história da Comunicação Social no RS, e vimos a exposição As faces do olhar, que insistentemente, nos questionava todo o tempo se, realmente, sabemos nos comunicar. " (...Vc tem ctz d q sabe msm c comunicar?). Eu não!!!!


Neste museu, ainda visitamos o seu acervo, disponível para consulta, que abrange diferentes áreas da Comunicação, como jornal, televisão, vídeo, rádio, fonografia, publicidade e propaganda, fotografia e cinema. Abaixo, um obra, no mínimo curiosa, que adoramos!!

Vamos nos reunir no quintal
e ver o quanto o nosso olhar pode ser generoso...


Incansáveis, sedentos de conhecer tudo o que pudessémos... seguimos para o Centro Cultural Érico Veríssimo, mas no caminho paramos... para ouvir e ver uma performance do Conjunto Bluegrass Porto-Alegrense, que costuma se apresentar, principalmente nas ruas - em tradicionais feiras de antiguidades e no centro da cidade - interagindo com o público e compartilhando, numa éspecie de oficina, o conhecimento da história da música bluegrass.


Depois de uns 30 min, seguimos para o CEEE e lá pudemos ver a Exposição Mário Quintana - O jardim interior. Maravilhosa, principalmente por se tratar do meu amado Quintana, mas, também pelas fotos e textos. I-nes-que-cí-vel!!!


No nosso último dia no Rio Grande do Sul, dois amigos maravilhosos: Juliana e Aníbal, nos deram de presente uma visita às cidades de Nova Petrópolis, Gramado e Canela. No caminho, conhecido como Rota Romântica, apreciamos uma bela vista de um dos tantos mirantes existentes nos 184 km da rodovia. O frio cortante e o vento no rosto nos fizeram sentir algo semelhante ao clima do Vale do Pati, na cidade de Andaraí, Bahia.


Eu e meu marido voltamos a ser crianças e nos perdemos no Labirinto Verde (Nova Petrópolis). Lá, dentro encontramos crianças, adolescentes, idosos e a alegria de viver o que a vida, generosamente, nos oferece.


A cidade de Gramado, por sua vez, é um pedacinho de alguma cidade europeia no Brasil. Eu nunca fui à Europa, mas a sensação que tive é que, por algumas horas, estive lá e aqui ao mesmo tempo. Me senti bem demais ao visitar o local, muito bonito por sinal, onde é realizado o Festival de Cinema de Gramado.


Tbm fomos ao Lago Negro (esverdeado), belo, calmo e bastante acolhedor.


Assim, como na capital gaúcha, Gramado oferece música ao vivo, de graça e de qualidade, no meio da rua.


Valeu a pena admirar a beleza da arquitetura da cidade...


Fechamos um dos dias mais maravilhosos de nossas vidas no Parque do Caracol, em Canela. Andamos por uma belíssima trilha ecológica. E, de novo, foi inevitável, não sentir saudades do Vale do Pati, da Chapada Diamantina, com a água respingando no rosto, das cascatas, corredeiras, do suor frio depois de uma caminhada no frio cortante do Sul. Aquele momento nos possibilitou sentir um pouco de Deus, um pouco do que temos de melhor.


Voltamos, nostágicos... lembrando de nosso amado Fernando Pessoa: tudo vale a pena se a alma não é pequena!!! Vamos nos permitir e deixar de nos incomodar com um cisco no olho, pois o bom da vida é passarinhar!!!

Fotos: Aníbal, Juliana, Maurício e Sol.
Texto escrito a quatro mãos!

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Carpe diem

aproveita o momento

quando os olhos falam uma língua 
que a língua não sabe
quando as mãos seguram o instante
como se fossem avaras de eternidade
quando os ouvidos apenas suportam
a música dos ansiados passos
e há um único aroma que se não repugna
quando o teu sorriso é o reflexo
do sorriso à tua frente
quando as estrelas são todas convocadas
para iluminar o rosto desejado
então é a hora o minuto o segundo
de fechar os olhos e ganhar asas

aproveita o momento

a vida só é curta quando não subimos
o estribo da carruagem que parte
quando ficamos a ver passar todos os comboios
a vida só é aventura quando se busca a ventura
que não tem pés para vir ter connosco
é preciso partir dar as mãos ao inédito
e assumir que quando caminhamos
nem todo o terreno é um pântano assustador
é preciso acreditar

aproveita o momento

porque outros momentos virão
em que nada pode acontecer
porque o tempo resvala inexorável
e o instante seguinte é muito tarde
e pelo menos tão desconhecido quanto este
porque os cabelos encanecem
e as mãos ficam murchas de esperança
e o peito qualquer dia é um assento de pedra
porque só agora é agora e logo o sol já se deitou
e amanhã já perdeste metade dos ensejos

aproveita o momento
e eterniza-o o mais que puderes
aproveita o momento
e dá-lhe as boas vindas
sorri-lhe manda-o entrar
e adormece no seu ombro.


MONTEIRO, Anthero. Carpe diem. In: Sete Vezes Sete Nuvens. Porto: Egoiste, 2010

sábado, 25 de setembro de 2010

É proibido fumar??

Meu marido comentou com sua amiga, a fotógrafa Carol Garcia (www.flickr.com/photos/carol_garcia), que casamento é, acima de tudo, cumplicidade. Ou melhor, é dividir com o outro que temos de melhor e pior. Se algum dia ele resolvesse, por exemplo, assaltar um banco, só a sua esposa saberia e vice-versa. Carol, então, nos indicou o filme É Proibido Fumar, escrito e dirigido por Anna Muylaert, e lançado em 4 de Dezembro de 2009. Por ter sido indicado por ela, uma pessoa inteligente e extremamente sensível, criamos uma grande expectativa em assisti-lo. Porém, na primeira tentativa, só conseguimos assistir uns dez minutos do filme... Nos distraímos, e acabamos conversando sobre nós... Não tenham dúvidas: é este um dos objetivos do filme!!!

Uma semana depois, decidimos que iríamos assistir ao longa metragem indicado por Carol. E o que encontramos? Primeiro, o ângulo da filmagem é extremamente atual. Às vezes, pelo movimento das pernas dos personagens conseguimos entender o que se passa com eles. Em segundo lugar, a trilha sonora é de primeira qualidade, com várias canções da Música Popular Brasileira (MPB), como "Taj Mahal" de Jorge Ben Jor, "Baby", de Caetano Veloso e "Filhos de Gandhi" de Gilberto Gil. E, em terceiro lugar, e o mais importante para nós, a cumplicidade existente entre Max e Baby, interpretados pelo cantor e compositor, Paulo Miklos (Titãs) e pela atriz, Glória Pires, respectivamente. A última cena do filme é maravilhosa, única, e diz muito sobre o amor!

Assistimos, nos vimos e comprovamos que num casamento as pessoas precisam estar prontas para o Outro e para o que ele traz consigo. É muito fácil está ao lado de pessoas bem resolvidas, sem problemas... Mas, onde estão essas pessoas estão? Será alguém bem resolvido neste mundo? Só nos resta, então, dizer: Muito obrigada, Carol, por nos dar a oportunidade de comprovar a nossa tese de que a convivência a dois precisa de uma cumplicidade diária!




Olhos


Calafrios, desde os 17 anos. Porém, o refazer-se diário transportava-a para o absurdo do não-ser, do esquecer-se de sentir a si mesma. Vivia como aqueles que passam e repassam na vida sem se darem conta do que são e do que poderiam ser.

Numa sexta-feira, comum e fria, voltava de sua habitual e única distração: o cinema. Sessão das 10h. Ensaio sobre a cegueira. Como uma criança que não tem pressa em terminar o sorvete numa tarde de verão, Júlia anda devagar até o ponto de ônibus revivendo as cenas do filme. Já tinha lido o livro. Mais um daqueles que nos “obrigam a parar, fechar os olhos e ver”. Mais um que a inquietou... mas não quis pensar. “A responsabilidade de ter olhos quando os outros os perderam”. Não, não queria pensar.

No ponto, ninguém. Espera...

Nada, a não ser a companhia de seus velhos calafrios.

Um barulho. O ônibus? Não. Faróis? Não. Olhos??? Sim! Negros, tristes e ofuscantes. Brasas cálidas que vinham em sua direção...

Júlia? Estátua presa, prostrada no asfalto. A garganta seca, trancada. O grito gritando, encarcerado.

Com a angústia daqueles que não podem correr, tampouco fugir, ou retirar-se às pressas, ela se entrega, quieta e trêmula, esperando.

Naquele corpo inerte, só os olhos viviam e viam. As lâmpadas, os cartazes, tudo estava na mesma ordem. Pessoas preocupadas com as suas próprias angústias e medos apareceram, passavam por ali, sem a perceber.

Um senhor encurvado pelo tempo, despercebidamente, esbarra-se na peça fazendo-a se mover alienada de volta ao ponto. Olha ao redor, a rua, e não os vê mais. Mesmo assim, sabia que eles estavam ali, olhando, sentindo e visitando-a com toda a intimidade dos amantes que nunca se despedem, como aqueles que insistem em ficar sem serem convidados.

O ônibus. Maquinalmente, entra e senta.

Abre o chuveiro. Liga a TV e dorme.

Estava numa fazenda abandonada. Santa Luzia era o nome escrito num pedaço de madeira, agora, habitado pelas formigas. Olha ao redor sentindo aquela terra triste, calcinada pela ausência. Ela também se sentia só...

Depois de andar por duas horas avistou uma velha casa de taipa. Os ossos à mostra, a pele comida por ele, o tempo.

-Será que há alguém?, perguntava a si mesma.

Esperançosa, seguiu até a pequena porta que, rangendo aqueles velhos ossos, abriu-se convidando-a.

Respira fundo.

- Eu vou?!!

E foi. Acompanhada dos seus velhos e íntimos calafrios, penetrou naquela irresistível desconhecida.

Procura. Inquieta-se. Procura...

Espera... Espera...

Um baque. A porta.

A fria escuridão. O medo.

-De quê? De quem?

-Medo do medo, respondia o vento que soprava lá fora.

Sofria, mas não chorava. Tateando no nada encontrou a parede. Ossos expostos. Trêmula, encolhe-se, contrai-se e, cerra os seus inúteis olhos deixando-se vencer sem lamúrias.

Naquele canto da sala, ela não pensa, não respira, nem chora, apenas se encolhe diante do desconhecido, do escuro, do beco sem saída que, por muitas vezes, encontramos em nossos caminhos. Lá fora, o vento sopra e agita-se na produção de uma espécie de lamento.

Júlia tem muitos medos. Contrai-se. Ulterinamente, se encolhe, e, a medida que os medos vão crescendo sente-se cada vez menor. Criança com medo do escuro, com medo de crescer. Está só de novo...

Dorme. Pela manhã, decide-se como a adulta que é: abrirá os olhos! Como um recém-nascido, germinando por anos, finalmente, decide-se. Esforça-se para sair da escuridão.

-Sim, o sol está do outro lado da porta!, diz para si mesma.

-Sim, eu consigo!, insiste.

Pensa em rezar, conforme havia aprendido na primeira comunhão, mas reza algo liturgicamente desconhecido. Não importa, reza e se encoraja.

-Vou abri-los, esforça-se.
Abre-os. Mas...

...só sente um oco.

O oco vazio.

O oco vazio do nada.

Gritos... (os insistentes toques do despertador).


sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Aos encontros

Há encontros que são sempre desejados
Uns veem seus desejos realizados
Outros, como eu, sonham...

Cheguei ao Aeroporto do Galeão às 17hs.
De lá, seguir, ansiosa, para um encontro na Av. Atlântida.
Há muito tempo, tento marcar este encontro...
Ele sempre ocupado com os seus textos dramáticos, suas crônicas, seus contos, seus desafetos...
Cheguei.
Desço do táxi e vejo, na varanda de um restaurante, ele.
Os suspensórios; o cigarro ordinário, entre os dedos; um cafezinho, ao lado.
Olhava para as meninas que passavam...
Não me conhecia, não sabia quem, de fato, eu era e aceitou este encontro!?
Fiquei, ainda, uns 18 min, olhando-o, emocionada.
Me aproximo e digo: - Nelson? 
Ele me olha e se lembra o porquê de estar ali: - Solange? Que prazer em conhecê-la!! Sente-se. Alguma coisa? Um cigarro?
- Não antes de um abraço...

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

A carta

Depois de dois anos de casada, Amélia continuava vivendo como uma moça aflita de emoções e cansada daquela mesmice de mulher séria e respeitável. O marido, Augusto, trabalhava na Petrobrás e por isso viajava muito. Estava, quase todo tempo, no Rio de Janeiro, deixando a mulher aos cuidados do amigo Sebastião e da empregada Aurora.

Amélia acordava às 10h e permanecia na cama até as 12h. Gostava de ficar de camisola, lendo os seus adoráveis romances. Agora lia A Dama das Camélias, de Alexandre Dumas Filho. E, a cada página, um suspiro de nostalgia que lhe cortava o peito. Queria tanto ser Marguerite Gautier que quando lia o romance esquecia-se de tudo e de todos. Imaginava a cena na qual Armand é apresentado a ela e ouvia Prudence, sua vizinha, lhe dizer que ele estava apaixonado... Amélia, decididamente, tomava o lugar de Marguerite para viver aquela história de amor, sem, é claro, sofrer as sanções que aquela sofrera.

Pensava em Augusto vez por outra e, principalmente, quando precisava de dinheiro para pagar seus luxos de burguesa de classe média. No resto, o marido não era o que sonhara. Não era romântico, nem tinha os galanteios que os personagens, imaginados e amados por ela, tinham. Casou-se porque tinha que ser assim... Para marido cumpridor de seu dever, Augusto servia. Além disso, ele não podia ser mais do que era.

Antes de se casar, Amélia teve apenas dois namorados. O primeiro foi Lúcio, amigo de seu irmão Joaquim, e que logo a decepcionou pelo seu temperamento machista e conservador. Já o segundo, Carlos, a agradou mais do que desejou. Recitava poesias, mandava-lhe flores, era gentil, cheio de galanteios e sempre lhe beijava como se fosse o último beijo de suas vidas. Aquilo a fazia estremecer e um frio lhe descia pelo corpo parando ali, onde as formigas imaginárias festejavam a sua ânsia de entrega.

Esse namoro durou apenas 06 meses. Carlos foi ao Rio Grande do Sul resolver alguns problemas de família. Amélia ainda esperou por 02 anos, mas ele não deu notícias e nem lhe mandou, pelo menos, uma carta.

Foi com o coração partido que encontrou Augusto. Moço promissor, assim disse seu pai. Já ela, pouco se importava com os elogios paternais ao seu novo pretendente, ainda sonhava com Carlos. Entretanto, o tempo é cruel e como ela já se aproximava dos 20 anos, o melhor foi se casar com aquele moço bom e gentil.

Depois do casamento, Amélia já não pensava tanto em Carlos. Havia substituído-o pelos rapazes que viviam escondidos nas páginas de seus livros. Não foram poucas as vezes, que sonhou com todos aqueles homens. Estava sempre nua, numa grande cama, e ao seu lado um homem forte, bonito e muito sedutor que a tocava luxuriosamente.

- Ah, como sou feliz!! Suspirava Amélia enquanto se entregava à eles.

Não houve como escapar: tornou-se amante de todos. E sempre que podia se transportava para a alcova do prazer, ali era feliz e era mulher. Ali, ela não precisava ter pudores nem os receios que a possuíam quando fazia amor com o marido de comportamento amoroso regrado.

- A mulher tem que ser séria até na cama, dizia Augusto. Eu não quero que a minha esposa peque nem comigo!

Ela concordava, beijando-o na testa.

Aurora, a sua empregada, vivia nos fundos da casa, num quartinho imundo e pequeno. Foi dama de companhia da mãe de Augusto e quando a velha faleceu ela pediu para ficar cuidando da casa e de D. Amélia. Augusto, com pena, concordou. Amélia detestou. Não gostava daquele olhar interrogador, mas para não contrariar o marido, aceitou-a. Quase nunca se falavam e quando isso acontecia Amélia só ordenava e a humilhava. Isso também lhe dava prazer... Assim viveram, todos numa eterna repetição, até o dia 12 de dezembro, uma semana antes do aniversário de Augusto.

Amélia foi até o centro para comprar algumas coisas para festa que sempre faziam naquela data. Festa não, uma reunião com Sebastião, ela e Augusto. Detestava aquilo, queria mais luxo, mais ostentação, mas o marido não era chegado a essas coisas.

Passa pela Delicatessen, vai ao Shopping e no ponto de táxi alguém a toca no ombro, vira-se e vê incrédula, Carlos. Reconheceu-o pelos olhos. Eram os mesmos.

- Amélia? Nem acredito. É você mesmo?

- Sim. Carlos? O que faz aqui?? (excitada)

O seu coração parecia que ia saltar pela boca. Um frio pelo corpo a fez gelar e tremer por dentro. Sempre sonhou com aquele reencontro, ao acaso.

Deixa o táxi e vão para uma lanchonete ali perto. Sentam e passam uma eternidade calados. Olham-se como da primeira vez.

- Você continua linda!

Excitada, Amélia fica vermelha e mal responde.

- O que há? Está tudo bem contigo? Não quer falar comigo? Vou-me então...

- Não, fica! É que estou surpresa. Nunca pensei em revê-lo (mentira). Faz muito tempo... e agora, você aqui, na minha frente. Nem parece real.

- Voltei para procurá-la. Nunca a esqueci, nem pude! Desde que partir que a trago aqui... (aponta para o peito). Ah, Amélia como sofri até o dia de hoje. Como me lamentei ter te perdido para outro. Por quê? Sempre me pergunto. Por que a vida fez isso conosco? Mandei-lhe cartas e você só me respondeu a primeira, e com muito rancor. Nem acreditei quando a li. Não podia ser você. Mas era...

Surpresa, ela não sabia o que dizer. Carta? Que carta? Nunca recebera nenhuma carta dele.

- Carlos, eu nunca recebi nenhuma carta sua, tampouco lhe respondi. Que história é essa?

Carlos tira um envelope amarelado pelo tempo e gasto de tanto ser tocado e lido por ele do bolso. Amélia não acredita, era a letra de Augusto!

- Meu Deus, como pôde? Ele sabia de nós dois? Como pôde fazer isso comigo?

Carlos tenta acalmá-la, mas é impossível. Amélia já estava descontrolada e com o coração em migalhas, despedaçado por aquela verdade. Levanta-se e diz adeus aquele homem que tanto desejou, mas que não foi capaz de fazer o que Augusto fez: Mentir e tripudiar pelo seu amor. Só quem ama muito é capaz de tal artimanha, pensou.

Retornou à sua casa mais mulher e feliz. Enfim, vivia um pouco daquelas histórias que tanto lera e invejara...


P.S.: Ainda na UEFS, em 2008, ao estudarmos o realismo português com o Prof. Cid Seixas, foi proposto à nossa turma que redigisse um texto literário a partir de dois romances de Eça de Queirós: O crime do Padre Amaro e O Primo Basílio. Aceitei o desafio e "parir" isso a partir do segundo romance. Sempre que o leio rio muito, pois tenho a sensação de está assistindo uma novela mexicana...

quinta-feira, 11 de março de 2010

Blogs, twitter, orkut e outros buracos

- Não estou no “twitter”, não sei o que é o “twitter”, jamais entrarei neste terreno baldio e, incrivelmente, tenho 26 mil “seguidores” no “twitter”. Quem me pôs lá? Quem foi o canalha que usou meu nome? Jamais saberei. Vivemos no poço escuro da web. Ou buscamos a exposição total para ser “celebridade” ou usamos esse anonimato irresponsável com nome dos outros. Tem gente que fala para mim: “Faz um blog, faz um blog!” Logo eu, que já sou um blog vivo, tagarelando na TV, rádio e jornais… Jamais farei um blog, este nome que parece um coaxar de sapo-boi. Quero o passado. Quero o lápis na orelha do quitandeiro, quero o gato do armazém dormindo no saco de batatas, quero o telefone preto, de disco, que não dá linha, em vez dos gemidinhos dos celulares incessantes.

Comunicar o quê? Ninguém tem nada a dizer. Olho as opiniões, as discussões “online” e só vejo besteira, frases de 140 caracteres para nada dizer. Vivemos a grande invasão dos lugares-comuns, dos uivos de medíocres ecoando asnices para ocultar sua solidão deprimente.

O que espanta é a velocidade da luz para a lentidão dos pensamentos, uma movimentação “em rede” para raciocínios lineares. A boa e velha burrice continua intocada, agora disfarçada pelo charme da rapidez. Antigamente, os burros eram humildes; se esgueiravam pelos cantos, ouvindo, amargurados, os inteligentes deitando falação. Agora não; é a revolução dos idiotas online.

Quero sossego, mas querem me expandir, esticar meus braços em tentáculos digitais, meus olhos no “google”, (“goggles” – olhos arregalados) em órbitas giratórias, querem que eu seja ubíquo, quando desejo caminhar na condição de pobre bicho bípede; não quero tudo saber, ao contrário, quero esquecer; sinto que estão criando desejos que não tenho, fomes que perdi. Estamos virando aparelhos; os homens andam como robôs, falam como microfones, ouvem como celulares, não sabemos se estamos com tesão ou se criam o tesão em nós. O Brasil está tonto, perdido entre tecnologias novas cercadas de miséria e estupidez por todos os lados. A tecnociência nos enfiou uma lógica produtiva de fábricas vivas, chips, pílulas para tudo, enquanto a barbárie mais vagabunda corre solta no País, balas perdidas, jaquetas e tênis roubados, com a falsa esquerda sendo pautada pela mais sinistra direita que já tivemos, com o Jucá e o Calheiros botando o Chávez no Mercosul para “talibanizar” de vez a América Latina. Temos de ‘funcionar’ – não viver. Somos carros, somos celulares, somos circuitos sem pausa. Assistimos a chacinas diárias do tráfico entre chips e “websites”.

ESCRITORES FANTASMAS

O leitor perguntará: “Por que este ódio todo, bom Jabor?” Claro que acho a revolução digital a coisa mais importante dos séculos. Mas estou com raiva por causa dos textos apócrifos que continuam enfiando na internet com meu nome.

Já reclamei aqui desses textos, mas tenho de me repetir. Todo dia surge uma nova besteira, com dezenas de e-mails me elogiando pelo que eu “não” fiz. Vou indo pela rua e três senhoras me abordam – “Teu artigo na internet é genial! Principalmente quando você escreve: ‘As mulheres são tão cheirosinhas; elas fazem biquinho e deitam no teu ombro…’”

“Não fui eu…”, respondo. Elas não ouvem e continuam: “Modéstia sua! Finalmente alguém diz a verdade sobre as mulheres! Mandei isso para mil amigas! Adoraram aquela parte: ‘Tenho horror à mulher perfeitinha. Acho ótimo celulite…’” Repito que não é meu, mas elas (em geral barangas) replicam: “Ah… É teu melhor texto…” – e vão embora, rebolando, felizes.

Sei que a internet democratiza, dando acesso a todos para se expressar. Mas a democracia também libera a idiotia. Deviam inventar um “antispam” para bobagens.

Vejam mais o que “eu” escrevi: “As mulheres de hoje lutam para ser magrinhas. Elas têm horror de qualquer carninha saindo da calça de cintura tão baixa que o cós acaba!”… Luto dia e noite contra cacófatos e jamais escreveria “cós acaba!”. Mas, para todos os efeitos, fui eu. Na internet eu sou amado como uma besta quadrada, um forte asno… (dirão meus inimigos: “Finalmente, ele se encontrou…”)

Vejam as banalidades que me atribuem:

“Bom mesmo é ter problema na cabeça, sorriso na boca e paz no coração!”

Ou: “A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso cante, chore, dance e viva intensamente antes que a cortina se feche!”

Ainda sobre a mulher: “São escravas aparentemente alforriadas numa grande senzala sem grades.”

Há um texto bem gay sobre os gaúchos, há mais de um ano. Fui “eu”, a mula virtual, quem escreveu tudo isso. E não adianta desmentir.

Esta semana descobri mais. Há um texto rolando (e sendo elogiado) sobre “ninguém ama uma pessoa pelas qualidades que ela tem” ou outro em que louvo a estupidez, chamado “Seja Idiota!”…

Mas o pior são artigos escritos por inimigos covardes para me sujar. Há um texto de extrema direita, boçal, xingando os brasileiros, onde há coisas como: “Brasileiro é babaca. Elege para o cargo mais importante do Estado um sujeito que não tem escolaridade e preparo nem para ser gari. Brasileiro é um povo trabalhador. Mentira. Brasileiro é vagabundo por excelência. Um povo que se conforma em receber uma esmola do governo de 90 reais mensais para não fazer nada, não pode ser adjetivado de outra coisa que não de vagabundo. 90% de quem vive na favela é gente honesta e trabalhadora. Mentira. Muito pai de família sonha que o filho seja aceito como ‘aviãozinho’ do tráfico para ganhar uma grana legal. Se a maioria da favela fosse honesta, já teriam existido condições de se tocar os bandidos de lá para fora… O brasileiro merece! É igual a mulher de malandro – gosta de apanhar…”

E o pior é que muita gente me cumprimenta pela “coragem” de ter escrito esta sordidez.

Ou seja: admiram-me pelo que eu teria de pior; sou amado pelo que não escrevi. Na internet, eu sou machista, gay, idiota, corno e fascista. É bonito isso?

Arnaldo Jabor
Transcrito do Estado de São Paulo

sexta-feira, 5 de março de 2010

SENALIC - II Seminário Nacional Literatura e Cultura – UFS

Prezados pesquisadores,
O II Seminário Nacional Literatura e Cultura acontecerá nos dia 27 e 28 de maio de 2010.

Inscrições para apresentar comunicações de 08/03 a 20/04.

Inscrições como ouvinte de 15/03 a 15/04.

Obs.: Até 30 de março haverá desconto de 10 reais na taxa de inscrição.


Grupos temáticos para apresentação de comunicação:

GT 1 – Crimes, Pecados e Monstruosidades

GT 2 – O imaginário mítico na literatura

GT 3 – Escritores sergipanos e regionalistas

GT 4 – Estudos de gênero na literatura e cultura

GT 5 – Ensino de literatura e literatura infanto-juvenil

GT 7 – Literatura Comparada em diferentes perspectivas culturais

GT 8 – Literatura e Estudos culturais

GT 9 – Literaturas pós-coloniais

GT 10 – Literatura e outras artes


Mais informações: http://www.pos.ufs.br/letras/senalic/index.php

terça-feira, 2 de março de 2010

Ah, o amor...



Amar: compreender

Casar: compartilhar

Brigar: pra quê?!

Choros e risos...

O Outro.

Nós! 

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

O que seria de nós sem artistas como Ron Mueck??









Ron Mueck é um escultor australiano hiperrealista que trabalha na Grã-Bretanha.
Este escultor utiliza efeitos especiais cinematográficos para criar obras de arte. São incrivelmente realistas e se não fosse o tamanho de suas esculturas certamente seriam fáceis de serem confundidas com pessoas.
No início de carreira, foi fabricante de marionetas e modelos para a televisão e filmes infantis, nomeadamente no filme Labyrinth.
Mueck criou a sua própria companhia em Londres, trabalhando para a indústria de publicidade. Embora altamente detalhados, estes adereços eram geralmente projetados para serem fotografados de um ângulo específico. Mueck cada vez mais queria produzir esculturas realistas.
As suas esculturas reproduzem fielmente os detalhes minuciosos do corpo humano, mas joga com escala para produzir desconcertantemente imagens visuais. Com cinco metros de altura, a escultura Boy 1999 foi exposta na Bienal de Veneza.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Canção para a menina maltratada


Não, não será com métrica
nem com rima.
Uma coisa sem nome violentou uma menina.
Ação barata
sem a prata
do pensamento
o ouro do sentimento
o dia da empatia. Noite.
Uma coisa. Não era o lobo
nem o ogre nem a bruxa,
era a fúria do real
sem o carinho do símbolo.
Stop, a poesia parou.
Ou foi a humanidade?
Stop nada, a menina sente e segue
com métrica, rima, graça, vida.
Onde está tua vitória, ignomínia?
Uma prosa continua
poética como era
saltitante o bastante
para não perder a poesia.
A coisa (homem?) é punida como um lobo
no conto de verdade. E imprime-se um nome
na ignomínia.
A menina liberta expressa
ri e chora, volta a ser
qualquer (única) menina.
Pronta para a métrica
pronta para a rima
pronta para a vida
(canto de cicatriz),
pronta para o amor a dois,
à espera, suave, escolhido.

Celso Gutfreind



P.S: Assistam o documentário “Canto de cicatriz” (RS, 2005, 37min, Beta). Direção, roteiro, montagem e produção executiva de Laís Chaffe. Documentário sobre violência sexual contra meninas. Direção de fotografia: Juliano Lopes Fortes. Música: Yanto Laitano. Direção de produção: Raquel Sager. Participação especial: Ingra Liberato, com o poema Canção para a menina maltratada, de Celso Gutfreind. PRÊMIO DIREITOS HUMANOS NO RS; DOIS PRÊMIOS GALGO ALADO NO GRAMADO CINE VÍDEO: MELHOR NO GÊNERO VÍDEO SOCIAL E MELHOR VÍDEO INDEPENDENTE BRASILEIRO.

domingo, 24 de janeiro de 2010

Sociedade



O homem disse para o amigo:
– Breve irei a tua casa
e levarei minha mulher.

O amigo enfeitou a casa
e quando o homem chegou com a mulher,
soltou uma dúzia de foguetes.

O homem comeu e bebeu.
A mulher bebeu e cantou.
Os dois dançaram.
O amigo estava muito satisfeito.

Quando foi hora de sair,
o amigo disse para o homem:
– Breve irei a tua casa.
E apertou a mão dos dois.

No caminho o homem resmunga:
– Ora essa, era o que faltava.
E a mulher ajunta: – Que idiota.

– A casa é um ninho de pulgas.
– Reparaste o bife queimado?
O piano ruim e a comida pouca.

E todas as quintas-feiras
eles voltam à casa do amigo
que ainda não pôde retribuir a visita.

ANDRADE, Carlos Drummond de. Nova Reunião: 19 livros de poesia.
Rio de Janeiro: J. Olympio; Brasília: INL, 1983, p. 31.

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Sem ilusões



Não, não pensem que existe um outro mundo! Pensem nas suas possibilidades aqui e agora! Reconheçam o valor deste mundo, pois só há este e ele é cruel, cheio de tragédias diárias. Ligue a TV e verás que “eles” só falam da violência, de sangue e mortes. Isto dá audiência! A morte dá audiência, muito mais até do que a vida! Ficamos ali à frente do aparelho (de controle), muitas vezes chorando, com pena e pensando o quanto é bom estar vivo. “Antes ele do que eu?” Mas, até quando?
Nos últimos dias, tanto a Tv quanto os jornais impressos e a internet vem noticiando as nossas tragédias líderes de audiência do momento. A Tragédia de Angra - na qual deslizamentos de terra causaram dezenas de mortes na madrugada do dia 1º de janeiro – foi disputada pelos canais de televisão exaustiamente. Quem tivesse o melhor depoimento, a melhor foto, o melhor texto (tem que ser uma novelinha, senão não emociona) levaria a audiência. Quem ganhou? Não sei!! Ou melhor, será que temos um vencedor numa situação dessas? Só sei que quando achávamos que o pior já havia acontecido neste ano novo, veio um terremoto no Haiti para nos fazer esquecer dos mortos do Rio de Janeiro. Agora são os pobres haitianos que estão na mídia, que estão na mira. São eles que alavancam a audiência dos canais televisivos, sites na internet e nos fazem refletir sobre a vida, o viver.
Ah, mas você pode me dizer que não assiste TV, tudo bem, seu vizinho, sua namorada, sua empregada, seu pai ou qualquer outro lhe contará tudo e, com detalhes. Você saberá que foi um terremoto de magnitude 7 na escala Richter que atingiu o Haiti no último dia 12 e que ele é o mais forte a atingir o país nos últimos 200 anos. O número de mortos não é conhecido com precisão, embora fontes noticiosas afirmem que pode chegar aos 200 mil, e o número de desabrigados pode chegar aos três milhões. Mas, será que o país mais pobre do hemisfério ocidental, com 80% de sua população vivendo em extrema pobreza, com menos de US$ 2 por dia, está passando pelo seu pior momento?
Um dado positivo: O Haiti foi a primeira república negra do mundo a declarar sua independência. Que bom!! Mas, não nos esqueçamos que 45,2% da população é analfabeta; a expectativa de vida é de apenas 60,9 anos; possui mais de 300 mil crianças órfãs; dois terços dos haitianos dependem do setor agrícola e são vulneráveis aos danos ocasionados por desastres naturais, agravados pelo desmatamento; o governo haitiano depende de ajuda internacional para seu sustento fiscal; o narcotráfico corrompeu o sistema judicial e as forças policiais; durante décadas, o Haiti viveu sob o poder dos governos brutais de François "Papa Doc" Duvalier e seu filho, Jean-Claude, conhecido como "Baby Doc"; o Haiti prossegue afetado por confrontos violentos entre gangues e grupos políticos rivais. Tudo isso levou a ONU a classificar a situação de direitos humanos como catastrófica. Cansou? Espero que não, porque em 2008, o Haiti foi atingido por uma série de tempestades e furações que deixaram cerca de mil mortos, mais de 800 mil pessoas desabrigadas e causaram prejuízos de mais de US$ 1 bilhão. O país também importa a maior parte da comida que consome o que fez com se tornasse um dos países mais atingidos pela crise alimentar causada pela alta nos preços dos alimentos...
Eu poderia ficar anos aqui mostrando a todos o quanto o Haiti é um país acostumado às tragédias, o quanto aquele povo sofre e o quanto ainda sofrerão. Entretanto, “contra fatos não há argumentos”, e o que nos resta é acreditar (sem ilusões) que no lugar daqueles escombros serão levantadas escolas, igrejas, casas... O que nos resta é acreditar (sem ilusões) que as toneladas de alimento que se encontram em galpões improvisados serão distribuídas a tempo, antes que a fome faça sua parte neste teatro de horrores. O que nos resta é acreditar (sem ilusões) que ainda há sobreviventes.
O que nos resta fazer????

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Haiti (Caetano Veloso e Gilberto Gil)



Quando você for convidado pra subir no adro
Da fundação casa de Jorge Amado
Pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos
Dando porrada na nuca de malandros pretos
De ladrões mulatos e outros quase brancos
Tratados como pretos
Só pra mostrar aos outros quase pretos
(E são quase todos pretos)
E aos quase brancos pobres como pretos
Como é que pretos, pobres e mulatos
E quase brancos quase pretos de tão pobres são tratados
E não importa se os olhos do mundo inteiro
Possam estar por um momento voltados para o largo
Onde os escravos eram castigados
E hoje um batuque um batuque
Com a pureza de meninos uniformizados de escola secundária
Em dia de parada
E a grandeza épica de um povo em formação
Nos atrai, nos deslumbra e estimula
Não importa nada:
Nem o traço do sobrado
Nem a lente do fantástico,
Nem o disco de Paul Simon
Ninguém, ninguém é cidadão
Se você for a festa do pelô, e se você não for
Pense no Haiti, reze pelo Haiti
O Haiti é aqui
O Haiti não é aqui
E na TV se você vir um deputado em pânico mal dissimulado
Diante de qualquer, mas qualquer mesmo, qualquer, qualquer
Plano de educação que pareça fácil
Que pareça fácil e rápido
E vá representar uma ameaça de democratização
Do ensino do primeiro grau
E se esse mesmo deputado defender a adoção da pena capital
E o venerável cardeal disser que vê tanto espírito no feto
E nenhum no marginal
E se, ao furar o sinal, o velho sinal vermelho habitual
Notar um homem mijando na esquina da rua sobre um saco
Brilhante de lixo do Leblon
E quando ouvir o silêncio sorridente de São Paulo
Diante da chacina
111 presos indefesos, mas presos são quase todos pretos
Ou quase pretos, ou quase brancos quase pretos de tão pobres
E pobres são como podres e todos sabem como se tratam os pretos
E quando você for dar uma volta no Caribe
E quando for trepar sem camisinha
E apresentar sua participação inteligente no bloqueio a Cuba
Pense no Haiti, reze pelo Haiti
O Haiti é aqui
O Haiti não é aqui.