"O irônico é uma vampira que sugou o sangue de seu amante e o abanou com frescor, o embalou até dormir e o atormenta com sonhos turbulentos" (Soren Kierkegaard. In: The Concept of Irony).

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Sobre a solidão


Eu, tu, a solidão e a morte



EU - Acompanhados ou não. A solidão nos habita. Está SEMPRE conosco.

TU - A morte também.

EU - Ufa! Que bom: pensei que erámos só eu a solidão!

TU - Já não morremos sozinhos. Vejo-as ao meu lado.

EU - Elas te espreitam no silêncio?

TU - Não. Dão gargalhadas! Ou: não dão gargalhadas.

EU - Vês Sísifo subindo o monte. Olhe ao seu lado.

TU - Consegue vê-las?

EU - Olhe direito. Ali. Estão lá.

TU - Que bom. Ele não está tão só.

EU - Vês Nair fazendo um aborto, a perfuração, o sangue,

TU - Glorinha que se vai e se esvai...

EU - Elas estão lá,

TU - dando-lhe o beijo que tanto queria na hora do retorno.


                                                                 

(Des)acompanhada


Cena 1:

Um show de MPB. É daquela banda que adoro. Os ingressos já estão sendo vendidos... Esse final de semana não, querida. Combinamos de ir à casa dos meus tios. Eu te avisei. Tudo bem, tinha me esquecido. Bom, daqui a quinze dias, haverá um musical naquele teatro do centro da cidade. O grupo é ótimo. Pensei em te convidar. Poxa, amor, você sabe que não curto teatro. A gente podia ir a um barzinho, tomar umas cervejas. Conversamos um pouco e depois seguimos para a minha casa. Que tal?

Cena 2:

Amiga, quanto tempo! Como tem andado? Morro de saudades da época da faculdade. Nos matávamos de estudar, mas também nos divertíamos um bocado. Tem notícias da galera? Nunca mais vi ninguém. Foi muito bom te encontrar por aqui. Olha, no sábado darei uma festa em minha casa. Vai rolar boa música. Chorinho. Você gosta? Me dá o teu celular. Vou te ligar e te passar o meu endereço. Gosto, sim. Vou aparecer. Obrigada pelo convite. Vá mesmo. E pode chamar quem você quiser, viu? Certo, mas acho que não levarei ninguém. Ah, desculpe, não tem quem te acompanhe? Está solteira ainda, moça? Você, hein, sempre exigente. Não é isso. Eu tenho companhia, mas ando só.

Lidiane Nunes.



Solitudinária


40 apartamentos ─ 40 galáxias.

Quase 200 pessoas ─ estrelas esgotadas.

Mais porteiros, visitantes e empregadas estressadas.

E a faxineira que vem toda quarta cantando “bororó, bororó”.

Todos moram comigo.

E eu moro só.

BARBOSA, Carlos. A segunda sombra. Rio de Janeiro: Multifoco, 2010.


Foto 1: Mr. Badger

Foto 2 : Imapix